95363320-180x180 [Este post foi escrito por Lemar Guillary, um trombonista que mora em Los Angeles e já tocou com artistas como Robin Thicke, Jennifer Hudson, Tedeschi Trucks Band e Dirty Dozen Brass Band.]

A sociologia dos músicos

Uma pessoa não é um objeto isolado de todos os outros. É especialmente um ser a quem é dada certa autonomia em relação ao ambiente com que tem contato imediato. – Émile Durkheim[1]

É imperativo que um novo músico procurando subir a escada da carreira do pop entenda qual é seu papel dentro do grupo no qual ele quer fazer sucesso.

Identificar os comportamentos de um grupo social é uma habilidade essencial para o seu desenvolvimento. Eu vou explorar teorias sociais, de linguagem corporal e de mentalidade para ajudar a melhorar suas habilidades como músico que faz “networking”, ou simplesmente contatos.

A teoria de Émile Durkheim foi revolucionária e também firmaram as bases para técnicas sociológicas. Eu encontro muitas similaridades nos seus escritos entre a dinâmica de grupos e do mercado musical. As teorias que Émile Durkheim apresenta em seus trabalhos Formas Elementares da Vida Religiosa, por mais que não seja originalmente focado em músicos, é válido para qualquer mercado ou sociedade que tenha suas próprias características e particularidades.

A Divisão Social do Trabalho, também de Émile Durkheim, determina como as tarefas serão feitas:

* Solidariedade Mecânica — Os membros de um coletivo acreditam nas mesmas coisas e todos os indivíduos desempenham a mesma função.

* Solidariedade Orgânica — Essa é uma sociedade mais complexa onde membros dependem uns dos outros para conseguir desempenhar as funções, com membros diferentes sendo capazes de executar tarefas distintas.

Na Solidariedade Mecânica, há bem menos ênfase no indivíduo do que no coletivo, enquanto na Sociedade Orgânica, há mais ênfase nas habilidades individuais de cada membro do coletivo.[2]

O que eu acho intrigante é que músicos pertencem às duas categorias ao mesmo tempo. O negócio da música, olhado do ponto de vista do músico, pode ser de Solidariedade Mecânica, em que a maioria dos músicos está ligada por um entendimento comum da teoria musical que usamos para nos comunicar durante o processo de criação. Mas o paralelo de que também funcionamos com Solidariedade Orgânica quando usamos o conhecimento e a experiência de outras pessoas para criar música.

O que é necessário para ser um ótimo coadjuvante

Um ótimo exemplo pinçado da indústria do pop sobre a mistura de solidariedade Mecânica e Orgânica e o exemplo do coadjuvante. O coadjuvante é o músico que acompanha alguém como Robin Thicke, Jennifer Hudson, ou Justin Timberlake, por exemplo. Esses músicos “laterais” oferecem seu conhecimento e experiência, algo que o artista principal não tenha. Portanto, o artista deve se apoiar nas habilidades de outros para que sua apresentação seja bem-sucedida. Isso é Solidariedade Orgânica. A Solidariedade Mecânica é a performance como um todo. Em outras palavras, todo mundo sobe no palco e deixa rolar!

O músico que faz “networking”

Descubra no que você é bom e explore o diabo disso. – Jimmy Owens[3]

A Solidariedade Orgânica, no contexto de Durkheim, é uma sociedade complexa. Isso também é válido para o músico que faz “networking”. Essa complexidade está no seu produto. Vamos usar como exemplo o caso de agências e vendedores. Eu recentemente fiz um teste para uma agência de eventos local. Durante o processo seletivo, que foi mais uma série de perguntas e respostas, me pediram que desse uma olhada no contrato, que eu teria de assinar se pensasse em trabalhar ali. Esse contrato se referia a mim inúmeras vezes como vendedor. Me ocorreu naquele momento que ser um músico não é tão diferente de ser um vendedor. Portanto, nós precisamos tomar muito cuidado para criar um tipo de produto que vá nos conseguir os empregos que desejamos.

Se você quer ser um guitarrista de blues, foque-se apenas no blues até ter dominado o estilo completamente. Se você é um tocador de trompete de vinte e poucos anos com poucos ou nenhum show marcado, mas gostaria de fazer shows de pop, então pratique a linguagem musical necessária para migrar para o novo gênero. Isso vai fazer do seu produto algo muito limpo e distinto. Isso não quer dizer que você não possa se arriscar em outros tipos de música, mas ter esse foco vai mostrar logo para seus empregadores quem é você, qual é seu estilo e por que te contratar.

A maioria dos músicos jovens que querem entrar no mercado de coadjuvantes do pop cometem o erro de achar que tudo o que precisam fazer é se tornar um virtuoso em seu instrumento. Isso está longe de ser verdade.  Pelo que vi na minha carreira, os músicos de sucesso com “networking” adotam o que eu chamo de  “a teoria do 60-40.”

A teoria do 60-40

A teoria do “60-40” divide a porcentagem de quanto você precisa ser um bom músico e artista, e de quanto você precisa ser um ótimo “rolê”.

O “rolê” significa o quanto a sociedade em que você está inserido ou gostaria de estar inserido gosta de você fora do palco. Baseado na minha experiência, eu tendo a acreditar que o “rolê” seja mais importante. Uma ação comum de músicos que querem fazer contatos é ir a sessões de improviso, as jam sessions. Em alguns dos melhores deles, você vai encontrar todo mundo do quem-é-quem dos figurões do mercado. O papel deles ali é fazer sua presença ser notada e também tocar uma música ou outra. Essas figuras já estabelecidas querem dar uma saída e encontrar quem é são os novos ótimos músicos por aí, e talvez até fazer contato com eles.

O objetivo do músico que faz networking é ser um ninja da estratégia. Esteja preparado para tocar uma música ou duas e colocar o melhor de si nelas. A coisa mais importante é que você se divirta!  Não tente tocar seis faixas seguidas, já que há mais músicos por ali tentando mostrar o que sabem também. Seu desempenho no palco vai chamar a atenção dos outros músicos presentes ali, mas não será o fator decisivo na hora de você conseguir um emprego. Os músicos da plateia vão parar de conversar por um minuto assim que você começar a se apresentar no palco, mas daí eles vão desencanar e voltar a conversar. Não faz sentido insistir em ficar muito tempo no palco. Coloque seu instrumento para descansar depois de tocar, vá ao bar pegar um drinque e olhe ao redor para checar se conhece alguém por ali que possa te apresentar a outros músicos ou fique pelo bar esperando a oportunidade para conhecer outros músicos. É aí que o “rolê” acontece. Então, em outras palavras, é 60% “rolê” e 40% de como você toca.

A teoria do 60-40 também faz parte do seu produto. Sua personalidade fora do palco é essencial na hora de fazer networking também. Vamos pegar como exemplo o número de membros que associações de músicos têm nos EUA: a ASCAP tem mais de 435.000 afiliados, e a BMI tem cerca de 500.000 membros registrados. Esses números não incluem os milhares, talvez até milhões, de outros músicos, amadores e profissionais. A pergunta persiste: o que te diferencia das centenas de milhares de outros músicos do mundo? Do ponto de vista social de músicos e de diretores musicais, também chamados de “DM” no mercado do pop, iam preferir lidar com um indivíduo que fosse uma excelência em trato social do que com um virtuoso da música que não tivesse traquejo nenhum.

Eu me formei na The New School for Jazz and Contemporary Music em 2008. Eu não fazia ideia se iria ficar em Nova York ou voltar para Los Angeles. Decidi que a sorte traçaria meu caminho. Duas semanas depois de eu voltar para casa para passar o Natal. Um amigo meu me ligou, um amigo que eu tinha procurado para ver se poderíamos sair para tocar juntos. Ele perguntou se eu poderia tocar com o Robin Thicke. O trombonista deles não poderia fazer toda a turnê dele e meu amigo foi chamado para ficar no lugar dele, mas tampouco podia se comprometer por muito tempo. Ele me perguntou se eu queria fazer isso e eu respondi “É claro, cara!” Eu acabei fazendo quatro shows com Robin Thicke antes de o trombonista original conseguir voltar. Enquanto estive na estrada com ele e a banda, eu consegui me comunicar com cada um dos membros do grupo separadamente. Eu me lembro de tomar café da manhã com o baixista, e de me dar muito bem com ele. Acontece que os outros membros da banda não estavam felizes com o outro trombonista no aspecto social, comentaram de vários confrontos dele com a banda e também com outras pessoas. Não é que o trombonista sofresse por falta de talento. Na verdade, ele carecia dos essenciais 60%.

Resumindo, lembre-se sempre de que você é o membro de uma sociedade com uma estrutura e uma hierarquia. O objetivo em aprender isso não é se forçar a ser algo que você não é, mas fazer que você conheça o que te cerca. Coloque a teoria do 60-40 em prática quando você estiver perto de outras bandas. Não importa se você está trabalhando como músico individualmente ou em uma banda, lembre-se que você é o vendedor de um produto. Não importa com quem você esteja tentando fazer contato ou conseguir um emprego. Você precisa apurar seu produto! Para as bandas de garage do bairro, isso pode significar um acordo entre todos os membros, para fazer aulas particulares e cada um manjar mais do seu instrumento. Isso também vale para o músico que se apresenta sozinho. Isso representa 40% do seu pacote, mas é bom que sejam ótimos 40%. Seja criativo na maneira que lida com “networking”. Um bom elogio à técnica de outro músico é sempre um jeito de se quebrar o gelo.

Bom Networking!

Lemar Guillary

1. 1Émile Durkheim, As Formas Elementares da Vida Religiosa (London: George Allen & Unwin LTD, 1964), 240.

2. [2] Émile Durkheim A Divisão do Trabalho (Free Press, 1984),

3. [3] Jimmy Own é um ótimo trompetista de Nova York.Eu me lembro de ele dizendo essa frase em aula na The New School for Jazz and Contemporary Music.

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